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Editorial: Por mais diálogo e menos cartilhas unilaterais

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Confira o editorial assinado por Débora Pereira para a 23ª edição da “Revista Profissão Queijeira”:

Dez anos atrás, o técnico francês Jacky Mège, dos Pirineus franceses, foi convidado pelo MAPA para participar de uma conferência sobre queijos no Brasil. Quando voltou para a França, me ligou para trocar suas impressões. Ele achou insano que no nosso país são os fiscais que determinam quando um queijo está bom para ser comido, e não os produtores. 

Na França, um queijo fresco de leite cru pode ser vendido normalmente nas feiras e mercados, porque os produtores sabem que seus rebanhos são saudáveis e o leite é de qualidade. Eles preferem vender queijos mais curados para ter mais sabor, e mais valor agregado, e não por condições sanitárias. No Brasil, produtores que têm rebanhos saudáveis e leite cru de qualidade não podem vender queijos frescos sem tratamento térmico por imposição dos fiscais agropecuários, eu nunca vi issso”, disse Jacky. 

Nas políticas públicas para o queijo artesanal, seguimos ainda a lógica da imposição unilateral de saberes, longe do diálogo e da construção coletiva de sensos comuns com os interessados… 

Em Minas Gerais, o governo, junto ao Ministério Público, Procon, IMA, Emater e Epamig lançou uma cartilha chamada “Projeto Queijo Minas Legal(PQML)”. Ela foi publicada com dinheiro do fundo de proteção do consumidor, sem nenhuma participação dos produtores e queijistas na construção dos conteúdos, menos ainda dos consumidores.

A cartilha fala de tempos de maturação mínimos exigidos para comer queijo de leite cru no Brasil, 60 dias, com encurtamento do períodos em queijos minas artesanal, entre 14 e 17 dias… “Nem sempre o queijo fresco é o melhor”, reza a cartilha, que sugere ao consumidor comer queijo industrial padrão se quiser frescor. 

Mas qual a realidade? Conheço um senhor de 80 anos no Vale do Piranga que compra um delicioso queijo fresquinho de leite cru duas vezes por semana, vendido diretamente pelo agricultor na feirinha da cidade. 

“Por abordagens mais educativas e menos punitivas

Ele nunca teve problema de saúde por comer esse queijo e não acredita mesmo no que ensina essa cartilha.  Assim como ele não acredita na lupa da embalagem, que te culpabiliza quando você compra um produto gordo, mas não te felicita quando seu queijo de leite cru artesanal povoa seu intestino de boas bactérias. 

O que desejamos de políticas públicas para o queijo no Brasil é que reuniões sem participação de produtores, queijistas e consumidores não aconteçam mais nos bastidores. Que audiências públicas sejam convocadas, que o consumidor seja respeitado na escolha da sua alimentação. Que fiscais tenham abordagem positiva e educativa, e não punitiva. 

Que uma parceria com órgãos diversos possa diagnosticar o número de produtores regularizados e a regularizar, para entender as razões dos que não alcançam o mercado formal e para definir os melhores caminhos para incentivar a regularização.   Na associação SerTãoBras, recebemos muitas reclamações de produtores quanto a essa metodologia de punição e não diálogo e educação. 

No Rio Grande do Norte um produtor com selo arte teve sua produção interditada, apreendida e seu nome difamado publicamente pelos fiscais do Idiarn, por alguns exames inconclusivos em vacas. No Rio Grande do Sul, uma produtora premiada chora quando conta seus problemas com a fiscalização local.

Até quando vai persistir essa situação? Seguimos atentos.

Boa leitura.
Saudações queijeiras.

 Débora Pereira

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