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França, diário de bordo: Missão Queijeira SerTãoBras/Faemg

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De 3 a 14 de junho, 40 brasileiros entre produtores de queijo, presidentes de sindicatos rurais e pesquisadores ligados ao queijo artesanal em Minas Gerais viajaram em missão técnica para conhecer caves de cura de queijo na França e participar do Mundial do Queijo em Tours, que ocorreu nos dias 11, 12 e 13, dia da volta para casa.

Essa missão foi uma iniciativa da Faemg, que convidou para fazer o roteiro da viagem a Mestra Queijeira Débora Pereira, diretora da SerTãoBras que mora na França desde 2011, onde trabalha na revista Profession Fromager. Foi ela que apresentou o queijo canastra do Guilherme Capim no concurso de 2015 e ganhou a primeira medalha brasileira no Mundial do Queijo. Depois desse sucesso, o Brasil foi convidado de honra do Salão no ano de 2017 e os produtores puderam apresentar seus queijos para degustação no stand da SerTãoBras e para concorrer no concurso. Foram 71 queijos brasileiros apresentados, das mais diversas regiões: Alagoa, Araxá, Canastra, Campo das Vertentes, Cerrado, Salitre, Serro, e até de Santa Catarina.

Resultado: 12 medalhas para os queijos mineiros no concurso do Mundial de Tours, festejadas e comemoradas, provando que nosso queijo tem reconhecimento internacional, apesar dos problemas que os produtores ainda passam para legalizar sua produção.

Confira o dia a dia da viagem…

Dia 4/6/2017

Paris: Palestra sobre Panorama do Queijo na França

Chegada em Paris! Primeira atividade em alto estilo: um passeio de barco pelo Rio Sena, onde Arnaud Sperat Czar e Débora Pereira apresentaram a conferência “Panorama da Cadeia do Leite e do Queijo na França”, com detalhes sobre cada local visitado pelos produtores durante a missão técnica.

“A palestra foi seguida por uma degustação orientada de alguns queijos franceses. Foi o primeiro contato dos brasileiros com o queijo francês com o cenário perfeito, foi maravilhoso” conta Hugo Leite, da Roça da Cidade, Serra da Canastra.

Panorama do queijo francês no rio Sena, Paris

Dia 5/6/2017

Provins: Visita às caves de Brie e ida à região do Comté

Os brasileiros visitaram a Ferme de Juchy, fazenda que produz os queijos Brie e Brillat Savarin, de leite cru, na pequena vila medieval de Provins, uma hora ao sul de Paris. “A estrutura da fazenda impressionou o grupo pela organização e pela forma de produção do queijo”, disseram Mariana e Lúcia, produtoras do Campo das Vertentes.

“Os queijos de casca florida precisam de três caves diferentes, uma para secar o queijo logo no início, uma mais quente para o mofo branco desenvolver e o mucor cinza não presperar, e uma cave para finalização da cura” explicou Morgan, responsável da Ferme de Juchy.

Ferme de Juchy

Depois de 4 horas de viagem, chegada à cidade de Poligny. Na Maison do Comté, o grupo aprendeu sobre a organização social coletiva da cadeia do queijo comté. Os produtores de leite local se organizam para transformar seu leite em ateliers de fabricação distantes à um raio máximo de 25 km de cada fazenda. Os queijos são entregues a 15 curadores oficiais, como o Fort Sant Antoine e o Fort de Rousses, que curam os queijos entre 4 e 36 meses para depois comercializar, em um sistema de distribuição de lucros discutido democraticamente por todos os participantes da cadeia.

“Vale destacar que quem ministrou a aula foi um produtor de leite para o comté, que muito se orgulha dessa organização, que prevê inclusive a quantidade de queijos que irão para o mercado para que não haja uma desvalorização do produto, pela nossa legislação, isso seria impossível no Brasil” disse Stella Mares, produtora do Serro.

Dia 6/6/2017

Poligny: Fabricar e curar queijo é ofício ensinado em escolas gratuitas 

Os brasileiros acordaram cedo para visitar os ateliers de fabricação da Enilbio de Poligny, Escola Nacional da Indústria Láctea com quatro sedes espalhadas pela França. Os brasileiros foram recebidos pela professora Delphine Gehant que os guiou por toda a estrutura, desde os ateliers de fabricação até as caves, atividade seguida de uma conferência sobre Cura de Queijos. Ao final, os produtores assistiram à uma apresentação sobre como impedir a falsificação de queijos utilizando as placas de caseína.

Enilbio de Poligny

Meio dia, hora do almoço, o grupo seguiu viagem para conhecer o Meilleur Ouvrier de France Marc Janin, em Champagnole, que propôs uma degustação de queijos locais, como o comté, bleu de Gex, morbier e outros. Assista o vídeo.

Marc Janin, Champagnole

Visita ao Forte Saint Antoine, na fronteira com a Suíça. Conhecido como a Catedral do Comte, o forte é uma construção militar de 1880 e que desde 1966 foi transformado em cave de maturação, com capacidade para curar 100 mil queijos comté por ano cada um pesando entre 35 e 40 kilos.

“Alem da estrutura existente, foi construída mais uma cave de 40 metros de largura por 80 metros de extensão em estrutura de concreto pré-moldado. Alem da magnitude do forte, o que impressionou foi o robo que lava e vira os queijos nas prateleiras” observou Hugo Leite, que é arquiteto e não perdia os detalhes das construções das caves.

Os brasileiros foram recebidos pelo Mestre Curador da Cave, Claude Query, que ao final da visita fez demonstrações da utilização da sonda e dos seus métodos para identificar os queijos que devem ser curados por mais tempo.

Fort Saint Antoine

Dia 7/6/2017

Les Moussières et Les Rousses: Catedral do queijo surpreende brasileiros

De manhã: visita à fabricação dos queijos Comté, Morbier e Bleu de Gex na queijaria Les Moussières. A surpresa foi o encontro com um grupo de queijeiros japoneses que, contagiados pela alegria dos brasileiros, ficaram para o almoço com o grupo.

Les Moussières

À tarde: visita ao Fort de Rousses,  que cura 180 mil queijos por ano. No coração do Parc Naturel du Haut Jura e a uma altitude de 1.150 metros, o forte foi construído por 3.500 homens comandados por Napoleão durante mais de vinte anos, sendo inaugurado em 1887. Seus quilômetros de corredores são usados como cave desde 1997 pela família Arnaud, da empresa JuraFlore. São mais de 50.000 m2 de salas e galerias subterrâneas. Chamou a atenção o forte cheiro de amônia das caves, esta liberada naturalmente no processo de maturação do queijo.

“Ficamos admirados de encontrar receita de pão de queijo entre as receitas distribuídas pelas cooperativas do queijo Comté”, disse um participante.

Fort de Rousses

Dia 8/6/2017

Teias de aranha na sala de maturação para evitar moscas

Viagem para Annecy, passando pela belas paisagens de lagos e pastagens naturais alpinas da Suíça. A primeira visita foi a boutique de queijos de Pierre Gay,  Os produtores ficaram surpresos de encontrar, nas cTeias e aranhas em cima dos queijos seriam, no Brasil, motivo para uma queijaria ser notificada imediatamente. Mas, na França, as aranhas são bem-vindas às caves de cura porque as teias servem de barreira natural para as moscas, evitando que botem ovos causadores de larvas nos queijos. O queijeiro Pierre Gay explicou: “Eu utilizo uma luz azul que atrai e mata os mosquitos na minha cave subterrânea da boutique, mas não dispenso a ajuda das aranhas e não removo as teias, elas são uma proteção natural e gratuita contra os insetos”.

Uma produtora de queijo mineira ficou surpresa ao ver as teias, pois teve sua queijaria notificada por uma teia de aranha “quase imperceptível” no teto:

”Eu me senti injustiçada, isso foi anotado no relatório e desde então eu sempre fico atenta para evitar as teias” disse ela. “Agora eu aprendi que, na França, a teia de aranha é permitida e incentivada como uma eficiente barreira contra os insetos. Vou sugerir à fiscalização que se informe sobre essa utilidade das teias, que inclusive são consideradas ecologicamente corretas” disse ela.

Annecy - Pierre Gay

Ao final da tarde, visita a Queijaria Guibert, em Aix-les-Bains, cidade da Belle Époque francesa conhecida pelos balneários termais. A única boutique de queijos da pequena vila é dirigida por Romain Guibert, que contou aos brasileiros como organiza sua boutique e sobre o funcionamento de sua cave.

Fromagerie Guibert

Dia 9/6/2017

Visita a feira de Annecy e ao Túnel da família Mons: eles também não usam cloro

Seis da hora da manhã todo mundo de pé para visitar ao Mercado de Annecy, onde os brasileiros viram que existem produtores “informais” também na França. Eles vendem seus queijos empilhados em mesas na feira livre do centro histórico duas vezes por semana. Todo mundo comprou queijo no stand de Marc Dubouloz,  terceira geração de comerciantes de queijo na cidade que tem a melhor oferta de tommes de Savoie e Comté.

Feira livre de Annecy

Para não perder o pique de uma viagem que é missão técnica e não tem tempo para turismo, cinco horas de viagem foram necessárias para chegar à Ambierle, onde estão localizadas as caves da Maison Mons. Os brasileiros foram recebidos por Laurent Mons, irmão de Hervé Mons. Melhor frase da viagem eleita pelo grupo, do mestre Laurent Mons:

“Cloro só na piscina!”

Ele completou:

“Os legisladores e sanitaristas geralmente são pessoas que nunca colocaram a mão na massa, nunca fizeram um queijo, e querem estabelecer regras que deveriam ser estabelecidas pelos produtores e curadores” disse ele.

Mas, como sua empresa exporta para mais de 30 países, ele gosta de se prevenir e faz o auto-controle: ao menos um produto de cada lote de queijo é examinado em laboratório uma vez por semana.

“Podemos dizer que as análises laboratoriais representam no mínimo 10% das despesas de nossa empresa” disse Laurent.

Visita do Túnel Mons com Laurent Mons

Dia 10/6/2017

Tours: rumo ao sucesso final

Viagem para Tours. Visita das caves de Rodolphe Le Meunier, presidente do concurso de Melhor Queijeiro no Mundial de Tours e ele mesmo o primeiro queijeiro a ganhar esse título em 2007. Suas instalações são modernas, seis caves reguladas com temperatura e umidade diferentes para acolher produtos de famílias tecnológicas diversas.

Caves de Rodolphe Le Meunier

Dia 11/6/2017

Mundial do Queijo de Tours: 170 expositores distribuídos em quatro andares do grande centro de eventos da capital da gastronomia francesa receberam mais de cinco mil visitantes em três dias.

Os brasileiros ganharam 12 medalhas no concurso de produtos: 1 super ouro, 1 ouro, 7 pratas e 3 bronzes. Estatística que promete aumentar na próxima edição do concurso!

Quatro brasileiros foram entronizados na Guilde Internationale de Fromagers:  Mariana Resende, do queijo Catauá, João Leite, do queijo Canastra Roça da Cidade, Roberto Teixeira de Castro da CoopeSerro e Altino Rodrigues, diretor da Faemg. “O reconhecimento desses profissionais e sua entronização na nossa Guilde foi devido ao seu engajamento no movimento pela valorização dos queijos de leite cru” disse Rolande Barthélemy, presidente da Guilde des Fromagers.

O concurso de queijos recebeu mais de 600 inscrições de 43 países, entre eles Brasil, Chile, Israel, China, Japão, Itália, Bélgica, Estados Unidos etc.

Mundial do Queijo de Tours

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2 Comentários

Celia lucia ferreira
27/06/2017 a 07:40

Esse diario sera rememorado nos anos vindouros como o caminho de redençao dos produtores de queijo feito com leite cru no Brasil. Isto porque Minas, alem de inconfidente, sempre sonha com o que esta alem das montanhas e nosso sonho é se libertar das amarras que impedem o QMA see livremente degustado em seu territorio , np Brasil e no mundo. Que essa luta persista que esse sonho se torne realidade pra todos no territorio nacional permitindo q nossos artesaos, produtores desse ouro branco, se libertem e deixem sua arte encantar, nitrir e contribuir para a economia do pais. Parabens Debora e a todos os que acreditaram nessa proposta. Paeabens aos mefalhistas e a tofos q contribuiram para o brilho dessa grande festa, primeira grande caminhada rumo a nossa libertacao..,,

Durval Gasparetti
14/07/2017 a 20:06

Reportagem muito interessante, é muito bom sabermos como a França mantem o controle de seus queijos sem todos os empecilhos que nossas autoridades impõe a nossos produtos artesanais praticamente impedindo a perpetuação de tradições produtivas. Muitas vezes levam os produtores artesanais e familiares a abandonar a atividade. Pelo contrário, as autoridades deveriam incentivar esse tipo de trabalho como gerador de renda para os pequenos produtores e dessa maneira fixando-os no campo. Por outro lado,como paulista sinto uma ponta de inveja dos mineiros, pois aqui não encontro queijarias artesanais que produzam bons queijos.

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