por SerTãoBras
Além de estimular o debate em torno do tema e dar maior atenção aos pequenos produtores excluídos, a expectativa é de que o evento represente um importante momento de interação e conhecimento entre os participantes e que se possam construir redes nacionais sólidas para a soma de forças e a elaboração de estratégias capazes de contribuir significativamente para a valorização e legitimação dos queijos artesanais. O que também se busca para garantir que os consumidores poderão continuar a desfrutá-los.
É desta forma que brasileiros integrantes do Movimento Slow Food, associação sem fins lucrativos que reúne vários países e que possui sede internacional na Itália, consideram algumas das possibilidades do I Simpósio de Queijos Artesanais do Brasil, que acontecerá entre os dias 23 e 25 de novembro, em Fortaleza-CE. O evento é uma realização da Embrapa Agroindústria Tropical, também situada na capital cearense, e da Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Rio Grande do Sul (Emater/RS).
Para discutir e apresentar contribuições ao Simpósio que fossem melhor afinadas com a proposta do Slow Food Brasil, foi constituído o Grupo de Trabalho sobre Queijos Artesanais, que conta com a parceria da ONG SerTãoBras. Esta possui sintonia com a principal referência adotada que é o Manifesto em Defesa dos Queijos de Leite Cru do Movimento Slow Food Internacional.
A avaliação que se faz é que o Grupo tem mantido diálogos produtivos sobre os queijos artesanais e, por sua participação e contribuição na programação do Simpósio, o considera de grande importância, pois é a primeira vez que produtores e aqueles que atuam nesse setor em várias partes do País estarão reunidos para discutir questões de seu interesse.
Mais foco na exclusão
O evento, da maneira como foi montado, está dirigido principalmente aos produtores artesanais que buscam formalização através de sua adaptação à legislação sanitária vigente. Contudo, além desta possibilidade, a preocupação do Slow Food Brasil se dirige para aquela parcela significativa de pequenos produtores artesanais que fica excluída desse processo, bem como para a perda da diversidade e das características positivas desses queijos com a adoção das normas estabelecidas.
Por esses aspectos, sua motivação central é a de fortalecer as discussões relativas à cultura, ao reconhecimento e à valorização dos modos de vida e saberes envolvidos na elaboração dos queijos artesanais, que em sua maioria não são reconhecidos pelos sistemas de inspeção. No Brasil, como argumenta a associação, a legislação segue critérios internacionais, baseados em padrões de produção industrial “higienista” e “sanitarista”, incompatíveis com as formas tradicionais e escala de produção dos queijos artesanais. Além desses produtos, é apontado que questões similares se colocam a outros alimentos tradicionais brasileiros, como por exemplo, os muitos tipos de farinha.
Participação internacional
Para a abertura das palestras do Simpósio estará presente Piero Sardo, presidente da Fundação Slow Food Internacional para a Biodiversidade, que é um ramo do Slow Food Internacional, presidido por Carlos Petrini. A expectativa é de que Sardo, que segue as campanhas em defesa dos queijos de leite cru que acontecem no mundo, mostre como elas se encontram e contribua para ampliar os debates. Isto porque, além de compartilhar aspectos da produção de queijos na Itália e na Comunidade Europeia, também poderá acrescentar outros elementos à discussão que não os focados unicamente nos aspectos normativos e higienistas.
Em sua colaboração com a organização do Simpósio, a associação inseriu na programação uma mesa sobre o papel dos movimentos e das ONGs na salvaguarda desses queijos e busca a maior presença de produtores artesanais tradicionais no evento. Para que se fortaleçam outros olhares, a Slow Food Brasil destaca a participação do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), que apresentará a perspectiva de registro dos queijos como patrimônio cultural imaterial.
Documentário oportuno
Para enriquecer o caráter cultural e gastronômico do Simpósio, foi colocada em sua programação paralela a exibição do filme “O Mineiro e o Queijo”, que contou com o apoio da SerTãoBras. O lançamento do documentário, que aconteceu nesse período de mobilização para o Simpósio, foi considerado oportuno pela associação.
Esta avalia que o filme, centrado na realidade mineira, trata de forma poética e leve, mas profunda, o impasse em que se encontra a produção dos queijos artesanais, mostrando as diferentes posições em jogo e dando voz aos produtores. A expectativa é que deverão se sentir contemplados e identificados produtores e consumidores de queijos de leite cru de várias partes do Brasil, como é o caso do coalho, manteiga e requeijão do Nordeste; do serrano e colonial do Sul, e do marajoara do Norte. A maioria dos consumidores, como salienta o Slow Food Brasil, desconhece as razões pelas quais os queijos artesanais se tornam cada vez menos acessíveis, em especial nos grandes centros urbanos, pois seu comércio se dá na informalidade, sendo muitas vezes “perseguido” por órgãos de fiscalização, inclusive nas feiras livres e mercados.
A mobilização para o Simpósio continua para que se encontrem parcerias locais para a realização de eventos culturais voltados à população de Fortaleza, com a exibição do filme seguido de debate, e a realização de atividades que valorizem os queijos tradicionais do Nordeste. Também se prepara para degustação no evento e na capital cearense uma mostra ampla e representativa de queijos essencialmente artesanais.
Para marcar posições, um manifesto sobre os queijos artesanais brasileiros se encontra em elaboração pelo Slow Food Brasil, com a participação da SerTãoBras, e que será apresentado em Fortaleza. (Com informações de Bibi Cintrão, Cênia Salles e Fabiana Thomé da Cruz, do Slow Food Brasil).
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