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Truculenta apreensão de queijos na capital do agronegócio gera discussão na internet

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Fiscais do Procon estadual e da Vigilância Sanitária apreenderam 720 kg de queijo que foram levados para destruição no aterro sanitário

No dia 22 de fevereiro, o promotor de Justiça de Defesa do Consumidor, Carlos Alberto Valera, com apoio da Vigilância Sanitária e da Polícia Militar, liderou uma grande operação de fiscalização em vários estabelecimentos comerciais de Uberaba-MG, que trabalham com a venda de queijos de leite cru.

Foram apreendidos 720 quilos de queijos comercializados em bancas, expostos à temperatura ambiente. A legislação exige  que o queijo artesanal estivesse refrigerado, embalado a vácuo, com informações nutricionais e de validade, além de selo de inspeção. Os comerciantes ficaram revoltados e alguns fecharam as portas.

O caso teve uma grande repercussão na mídia local e estadual. Audiências públicas se sucedem desde 18 de março, com a presença de representantes dos segmentos diretamente envolvidos: Emater, Instituto Mineiro de Agricultura (IMA), Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Uberaba, secretarias de Saúde e Agricultura, comerciantes, produtores, vereadores locais e de cidades vizinhas, deputados. E Leôncio Diamante, pela Sertãobras.

Queijos mandados para o aterro sanitário

Foi montada a chamada “Comissão do queijo”, formada por algumas das entidades citadas acima, cujo objetivo é orientar produtores e comerciantes do produto para se  adequarem à legislação estadual. A “Comissão do Queijo” ficará ainda responsável pela elaboração de uma proposta que será apresentada ao Ministério Público, com a intenção de que este último faça um Termo de Ajuste de Conduta, garantindo tempo ao pequeno produtor para se adequar à legislação. Segundo o deputado Paulo Piau, será marcada em Brasília uma audiência pública para discutir a legislação sobre o queijo.

Enquanto as autoridades se organizam, o caso continua mobilizando produtores e apreciadores do produto. Logo após a apreensão começou a se espalhar pela internet, com grande velocidade, um artigo – ora assinado por Luciano Borba, ora anônimo – cujo título é “O queijo assassino”. O texto tem um tom sarcástico, faz o leitor pensar se esse centenário queijo artesanal é realmente perigoso ou se assassinos são aqueles que tentam matar um patrimônio imaterial do Estado, reconhecido pelo Iphan.

Como disse a internauta Cleusa Diniz, “este texto retrata bem o fato de que toda atividade relacionada ao conhecimento tradicional, que mantém realmente a autonomia e sustentabilidade do empreendedor, é desinteressante ao sistema que vê o produtor dessa categoria, como um subversivo do mercado”.

Leia o texto na integra:

O queijo assassino

por Luciano Borba

Retirado do jornal Tribuna Livre,

de Ouro Preto

Na Terça, 22 de Fevereiro, em Uberaba houve uma “operação de guerra” na qual policiais militares devidamente armados, Procon estadual e vigilância sanitária derrotaram um bando de queijos. Os facínoras estavam expostos em bancas do comércio, principalmente no Mercado Municipal, ameaçando os clientes pois estavam despidos de uma embalagem à vácuo e pior, sequer portavam sua tabela de informações nutricionais.

A comunidade pode ficar tranquila, os heróis que defendem nossas vidas dos ataques desses queijos de péssima índole venceram, quase uma tonelada foi apreendida e destruída pois era “imprópria para o consumo”. Que bom que em meio a tantos estupros, arrombamentos, roubos de cargas, tráfico de drogas, sequestros e latrocínios ainda exista gente para nos proteger dos laticínios.

Ora autoridades, tenham um mínimo de bom senso, a fabricação e consumo de queijos é um costume milenar no mundo e multi secular em Minas. O nome diz, queijo mineiro, feito de leite de vaca, usando coalho que por sí só já é um agente biológico que o azeda.

Essa tradição, mais que centenária, nunca matou ninguém, meu trisavô já vendia queijos “marginais” em Dores do Indaiá e nunca foi tratado como bandido, ou será que devemos nos arrepender por todas as fatias que já engolimos, às vezes com goiabada caseira (também despida).

O queijo mineiro, principalmente da Serra da Canastra é apreciado como uma iguaria, porém se for levado à geladeira altera seu sabor original, como querem esses “soldados” que doam suas vidas, se preciso for, para nos livrar desse “venenoso alimento”.

Parece que o Procon não sabe, mas costumamos, “até mediante torturas físicas”, deixar os queijos expostos ao ambiente para que eles fiquem curados. O IMA (Instituto Mineiro de Agropecuária), casa de burocratas, impõe que ele seja embalado à vácuo e que traga na embalagem informações nutricionais. A continuar nesse pique o pão francês será o próximo, imagine um pãozinho embalado individualmente, com uma tabelinha de nutrientes e data de validade para sabermos se ele está quente do forno ou não. Tratam-nos como se fossemos ignorantes e sequer soubéssemos escolher uma fruta, um doce ou um pé de alface, deixem disso, temos mais o que fazer.

Estão extinguindo as chances de sobrevivência do pequeno produtor rural, aquele mesmo que por falta de opção vai ser um João Ninguém na cidade onde seus filhos poderão exercer atividades menos regulamentadas como o tráfico. O excesso de normas inviabiliza os pequenos negócios em detrimento de grandes laticínios e hipermercados, portanto gera desemprego e tensão social.

Fica, para as autoridades, um questionamento do povo: Se prendem os queijos, porque não prendem os ratos?

Atualização (13/04/ 2011):  O texto saiu  publicado no Tribune Livre com a autoria de Luciano Borba por um equivoco interno do jornal. Dessa forma, a autoria do texto continua desconhecida.

Repercussão do texto na internet, entre blogueiros, consumidores e “sanitaristas”

Geraldo Porci de Araújo, blogueiro:

“Horror. Eu Geraldo Porci de Araújo, com 79 anos, trabalhei nas lavouras (rosa) durante 22 anos, sempre comendo queijos. E nunca vi falar que queijo matasse ninguém. Já vi queijos ficar velhos, alguns chegavam pegar bichos e ninguém comia. Estou vendo a maior injustiça com os produtores Rurais e os criadores de gados.”

Ranne Cássia, blogueira:

“Recebi um e-mail com esse texto, infelizmente sem mencionar a autoria, e achei super hiper mega relevante citá-lo aqui no blog… (…) Eu sou mineira… triangulina, na verdade… e como boa triangulina sou do tipo que preserva os costumes, as tradições… enfim… tão complicado… o queijo mineiro nunca precisou ficar à vácuo, sempre ficou exposto e ninguém nunca morreu no Triângulo Mineiro, por consumir queijo (inclusive, na roça, enquanto cura, fica cheio de mosquito em volta kkkk…. ai eu amo minhas minas gerais e seus queijos assassinos)…”

Joaquim Eustaquio de Souza Amado no site Rede de Inovação para Defesa Agropecuário:

“(…) um texto que mostra a todos nós a grande necessidade de um trabalho constante de educação sanitária. Muitos, assim como Liana, eu mesmo e provavelmente muitos outros profissionais Médicos Veterinários, que leram este artigo já se indignaram. Entretanto, talvez a nossa reação deva sim ser de reflexão.

O tipo de opinião manifestado pelo tal Autor Desconhecido, é justamente um eco da necessidade eminente da atuação do sistema de defesa agropecuária e dos formadores de opinião da área de ciências agrárias, engenharia de alimentos, nutrição e saúde pública, em se unir em contínuo e integrado esforço de educação sanitária.”

Liana, internauta, que comenta o texto no site Rede de Inovação para Defesa Agropecuário:

“Ainda bem que o autor é desconhecido, a ignorância é tanta, que dá até dó!!!! Nunca deve ter sido apresentado às listerias, salmonelas, coliformes, estafilococos, micobacterium… nunca deve ter consultado sobre os dados hospitalares e os dados da vigilância sanitária sobre o número de casos de toxinfecções alimentares, inclusive com casos de morte. Mas a vida é assim mesmo, quem quer escolher comer queijo, come queijo e quem quer escolher comer bosta, coma bosta… Por favor, repassem, quem sabe chega ao remetente, pois o mesmo não tem coragem se quer de se identificar…”

Márcio Adélio de Carvalho, outro comentarista do Rede de Inovação para Defesa Agropecuário:

“É bem característico de pessoas com menos instrução e conhecimento sobre os perigos e malefícios causados por alimentos sem as devidas características sanitárias próprias, sempre se passar por coitadinhos e perseguidos das organizações de saúde pública e fiscalização sanitária, nenhuma novidade, é aquela estória, eu podia estar roubando, matando… ora essa, um produto inadequado é inadequado, e pronto não interessa se é de um produtor grande ou pequeno, a saúde da população tem de ser preservada!!!”

Geraldo Magela Mota, blogueiro:

“Não podemos deixar de reconhecer que o nosso queijo está lutando para fazer valer o seu direito de ser “patrimônio cultural”, a exemplo do que já o é na “Vila do Príncipe”, conforme louvável determinação do Governador Anastasia. No entretanto, estão obrando ao contrário as demais “otoridades” que preferem militar a favor das empresas e suas corporações, que a favor dos interesses dos lavradores familiares, dos pequenos produtores e dos queijeiros artesanais.”

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3 Comments

antonio
09/04/2011 at 20:04

Caros Liana e Marcio Aurelio, do alto de minha ignorancia e falta de instruçao, sugiro a vcs.; por que não dão alguma sugestão que possa auxiliar os milhares de camponeses que vivem desta iguaria, e ainda manter uma tradição secular, que é uma tendencia e realidade na frança, estados unidos, etc.ao invés de criticarem a esmo, citando até “comer bosta,”deselegante pra pessoas de fina estampa como me parecem!, certamente são proprietariso de laticinios(tb sou e não penso como vcs)(o sol nasce para todos) ou vcs.so comem queijos do Carrefour, grandes redes, etc. Nestes estabelecimentos tb tem salmonelas viu?

edson
20/11/2015 at 11:38

meu pai, falecido aos 96 anos de idade, morava no triangulo mineiro (araxa-MG), comprou, produziu, vendeu, revendeu queijo durante mais de vinte anos, nunca houve um caso sequer de queijo que tenha provocado uma “dor de barriga”. Os queijos eram transportados em cavalos, as condições eram piores que as de hoje, porém o problema esta na forma como o governo de minas conduz a situação, desde que se abra uma linha de crédito, assistência técnica, muitos pequenos produtores poderiam se adaptar as normas sanitárias, porém não há sequer um programa efetivo e pratico do governo de minas que reverta esta e outras situações que afligem o pequeno produtor rural no estado de Minas.

Anderson Amaral
24/06/2017 at 22:59

Texto maravilhoso! O ilustríssimo Promotor de Justiça que comandou o circo, não deve saber que o queijo é mais velho que a geladeira; Que se o produtor do campo for comprar uma maquina que embala a “vacuo”, ele não faz a feira; que se ele for cumprir as “normas” fiscais e sanitárias, seu queijo perde o artesanal, e o produtor, perde o cliente.
Mas claro que o nobre membro do MP, erudito como é, sabe disso tudo e tem consciência social.

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