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IPHAN: Salva-Guarda do queijo de leite cru

O IPHAN – Instituto de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional promoveu dia 25 de agosto de 2010, em Rio Paranaíba, uma reunião com os produtores de queijo de leite cru da região do Cerrado.

A cientista social do IPHAN, Corina Moreira, ao lado dos produtores.

O objetivo foi diagnosticar quais os primeiros passos para o programa de Salva-Guarda do queijo como patrimônio imaterial da cultura (registrado em 2008). A Salva-Guarda prevê um conjunto de ações para garantir a continuidade da arte de fazer queijo, durante cinco anos. “Como vemos que não existe risco de se perder o modo de fazer o queijo, pois é uma tradição bem arraigada, pretendemos identificar quais são as formas de valorizar o queijo, enquanto cultura”, explica Corina Moreira, cientista social do IPHAN.

Degustação de queijo sempre acontece no encontro dos produtores.

O encontro foi realizado no centro comunitário da Fazenda Palmeiras, e contou com 22 produtores da Associação dos Produtores de Queijo Minas Artesanal de Rio Paranaíba – Apromar, e técnicos da Emater. Eles assistiram ao vídeo do IPHAN e depois discutiram sobre as dificuldades.
O presidente da Apromar Marcos Bispo disse que o que mais os incomoda é o fato de não haver uma diferenciação dos produtos por região geográfica.

O queijo do Alto Paranaíba, mesmo com sabor diferente, chega no mercado central de Belo Horizonte como queijo da Canastra. E no próprio vídeo do IPHAN, há uma diferenciação entre queijo do Cerrado, da Serra do Salitre, da Canastra e do Serro, mas não se menciona o Alto Paranaíba.

Fonte: Emater.

A técnica da Emater informou que este tipo de diferenciação é desejada por muitos produtores de locais diferentes, mas que depende da mobilização de cada um. Em 16 de abril de 2010 produtores do Serro e da Canastra (Medeiros) entraram com pedido de Indicação Geográfica no INPI – Instituto Nacional de Propriedade Industrial, no Rio de Janeiro.

Cadastrados versus Clandestinos
Outro problema citado por Marcos Bispo foi a concorrência com os preços baixos praticados pelos produtores não cadastrados no IMA. “Quando começamos a organizar a associação, achamos que o mais difícil era cimentar as queijarias para estar de acordo com as normas, mas agora vemos que nossa maior dificuldade é vender o queijo, que custa R$10 o quilo, por causa da concorrência com os produtores não cadastrados pelo IMA, que vendem por R$6 o quilo”, conta Marcos Bispo, presidente da Apromar.

Queijaria de acordo com as normas do IMA, na comunidade Fazenda Palmeiras, em Rio Paranaíba.

Para ser cadastrado, o produtor precisa adequar sua fazenda a várias normas fito-sanitárias e não há subsídio governamental para esta adequação, por isso a maioria não se mobiliza para o cadastramento. Para a coordenadora técnica estadual do programa do queijo Minas artesanal da Emater, Marinalva Soares, os produtores cadastrados deveriam denunciar os clandestinos ao Ministério Público, a fim de coibir a produção não certificada. Mas Marcos Bipos não concorda: “não podemos denunciar aqueles que são, muitas vezes, parentes, vizinhos e amigos”.

Força das Mulheres
Dona Perpétua, dona Maria, Jacilene, Lenice e Cristiana Oliveira, secretaria da Apromar, são as representantes femininas da força do queijo no Cerrado. Ao contrário da região da Canastra e do Serro, no Cerrado há muito mais mulheres fazendo queijos do que homens.

Dona Perpétua, Lenice, Maria Aparecida e Jacilene, da esquerda para direita, são produtoras da Apromar, em Rio Paranaíba.

Por causa disso, as reuniões mensais da associação sempre terminam em quitutes mineiros, como pão de queijo, broa de fubá, pudim de pão, goiabada…

Pão de queijo, broa de fubá, café, goiabada, e claro, queijos. Ao centro, a coordenadora do Programa do Queijo na Emater, Marinalva Soares.

Dados do leite produzido em Rio Paranaíba:
45% vira queijo de leite cru
55% vai para indústrias de laticínio

Tradição Familiar
Dona Maria Aparecida e sr. Sinval Martins fazem queijo todos os dias, de manhã e de tarde, do leite de 28 cabeças de gado ‘misturado’, como se referem à raça Gir-Holanda. São 18 peças por dia, que pesam por volta de 25 quilos, entregues em Divinópolis junto com toda produção da Associação.

Sinval Martins e Maria Aparecida, que sabem fazer queijo desde pequenos.

Sinval conta que falsificaram a embalagem do seu queijo em Belo Horizonte, com todos os dados (endereço, nome da fazenda e número do registro do IMA). Eles prestaram queixa na Polícia e registraram o ocorrido no IMA, mas não encontraram os culpados.

Enquanto Maria Aparecida cuida de fazer o queijo, Sinval cuida de tirar o leite. Eles não têm empregados na fazenda.

Além das reformas na fazenda, eles fazem de 4 em 4 meses exames na água e no gado, a fim de detectar doenças. “A exigência do IMA é uma vez por ano, mas como já tivemos nossa queijaria fechada por causa de uma bactéria, preferimos fazer sempre, por nossa conta”, afirma dona Maria.

IPHAN e a Salva-Guarda do Queijo
Sobre a Salva-Guarda, serão realizadas ainda reuniões no Serro, Medeiros e São Roque de Minas com a mesma pauta apresentada em Rio Paranaíba. Depois, representantes de cada um destes locais participarão de uma reunião em Belo Horizonte, em 27 e 28 de setembro.

Os queijos da Apromar são marcados em alto relevo com nome, origem e registro do produtor.

Centro de Qualidade do Queijo
Dos 400 produtores de queijo de leite cru no município de Rio Paranaíba, apenas nove estão cadastrados pelo IMA. A informacão é do técnico da Emater Joaquim Tobias, do município de Rio Paranaíba, onde será inaugurado o Centro de Qualidade do Queijo, um espaço no centro da cidade onde o produtor (somente cadastrado) poderá entregar seu queijo para maturar e ser embalado e vendido.

Corina Moreira, do IPHAN, visita o Centro de Qualidade do Queijo de Rio Paranaíba, que ainda não foi inaugurado

Rio Paranaíba tem uma população de 13.093 habitantes (IBGE 2007), sendo que 40% da população vive na zona rural. A cidade faz parte da região do queijo chamada Cerrado, que abarca 19 municípios, entre eles Coromandel, Serra do Salitre e Patrocínio (veja mapa). A Emater mantém uma veterinária e uma técnica para apoiar os produtores cadastrados da região.

Patrícia, Marinalva e Tobias, da Emater, e Corina, do IPHAN.

Produtor vira lavador de carro
Ao voltarmos para Belo Horizonte, lavamos o carro da Sertãobras no posto de gasolina de Rio Paranaíba. Lá, conhecemos Roney Batista Ferreira, que contou que era produtor de queijo, mas faliu por causa das multas do IMA e por ter seus produtos apreendidos quatro vezes seguidas, quando levava para vender em Belo Horizonte.

Roneu Batista Ferreira, que faliu como produtor de queijo após multas do IMA.

Ele disse que adora fazer queijos e que, na sua família, todos fazem desde pequenos, mas que não tiveram condições de cumprir as normas para o cadastramento. “Meu sonho, uma dia, é poder voltar a produzir queijo”, afirma o lavador de carros.

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